Publicado em: 06/04/2020 12:46:31
As contaminações e mortes por coronavírus na Cidade de Porto Velho terão números alarmantes se a sociedade e o Poder Público não se mobilizarem pelo isolamento social, pela vacinação da gripe no grupo de Risco e na intervenção nas áreas vulneráveis da cidade
Discussão do Cenário para as contaminações do covid-19 no Município de Porto Velho
Artur de Souza Moret- amoret@unir.br
Coordenador do Grupo de Pesquisa Energia Renovável Sustentável (http://www.energsust.unir.br/)
1- Contextualização Brasil e Rondônia
A pandemia do coronavisrus, covid-19, mudou a dinâmica mundial em curto espaço de tempo porque o início dos casos apareceram na imprensa nos últimos meses de 2019 e neste momento (abril de 2020) há muitos países com contaminações e mortes, alguns com muitos outros com poucas. A contaminação é planetária porque o principal vetor de passagem do vírus é o contato social e a capacidade de contaminação individual é de 4 a 6.7, a depender do pais que for analisado. A China e Coreia do Sul são exemplos de sucesso no enfrentamento da pandemia, tomaram decisões rápidas, conseguiram debelar o processo e as mortes (março de 2020) com interrupção da locomoção das pessoas (lock down), com monitoramente e testagem em massa. Entretanto, outros países não foram neste caminho e estão pagando caro com as mortes, destacam-se Itália e Espanha (março de 2020), EUA (abril de 2020), porque demoraram a tomar decisões para controle, neste rol destaca-se o o governo Trump que queria resguardar a economia.
O Brasil seguiu o mesmo caminho dos EUA e o Presidente da República reiteradas vezes se opôs ao isolamento social, indo no sentido contrário as posições do Ministério da Saúde e de alguns Governadores. Os resultados podem ser graves, porque uma parcela da população apoiou a proposta (principalmente empresários que queriam a volta das atividades econômicas) e em muitos locais a população diminuiu o isolamento, Rondônia e Porto Velho inclusos, voltando à rua e ao comércio. É importante destacar que, não por coincidência, o número de infectados no Brasil cresceu efetivamente depois do dia 31/03 que foram os 7 dias após o Presidente fazer um pronunciamento contro o isolamento social e por isso as pessoas diminuiram o isolamento social e foram contaminadas.
O Estado de Rondônia iniciou o processo na segunda março de fevereiro se aliando as posições do Ministério da Saúde e convergindo com a maior parte dos governaores, emitindo decretos de situação de Emergência (Decreto n° 24.871, 16/03/2020) e o deCalamidade Pública (Decreto nº 24.887, 20/03/2020) com proibição de qualquer aglomerado de pessoas e incentivando a população a permanecer em isolamento. Entretanto, a partir de 24/03 com o pronunciamento do Presidente criticando o isolamento, o Governador de Estado se aliou à ideia e emitiu decreto (Decreto n° 24.891) flexibilizando o isolamento e alterando principalmente a alínea f do Art. 3o do Decreto nº 24.887 de 20/03/2020, incluindo muitas atividades econômicas como essenciais e que poderiam funcionar no período. No que tange a Rondônia não é possível mensurar se houve aumento de infectados com a influência desta flexibilização (que já pode ser observado nos dados agregados do Brasil) porque simplesmente em Rondônia não há testes para a detecção da covid-19.
2- Estimativas para as contaminações por coronavírus na cidade de Porto Velho
As estimativas dos infectados para a Cidade de Porto Velho (PVH) tem como referência os valores produzidos na modelagem estatística do Imperial College London para os cenários do covid-19 no Brasil, resultante do trabalho: “The Global Impact of COVID-19 and Strategies for Mitigation and Suppression”1.
Os cinco cenários são construídos de acordo com medidas de intervenção ou mitigação no Território. Os cenários estão sucintamente apresentados a seguir:
Cenário 1- Sem medidas de mitigação
Cenário 2- Com distanciamento social de toda a população
Cenário 3- Com distanciamento social E REFORÇO do distanciamento dos idosos
Cenário 4- Com supressão tardia
Cenário 5- Com supressão precoce
A discussão dos dados e a proposição de um cenário provável para o Estado de Rondônia foi apresentados no artigo “Uma visão prévia sobre o crescimento da contaminação do covid-19: as condições implantadas e os cenários para o Estado de Rondônia”2.
Nas estimativas para PVH foram reproduzidas o mesmo modelo utilizado para o Estado de Rondônia, ou seja, os valores da cidade serão proporcionais aqueles do Estado com as seguintes condições para as populações: Rondônia- 1.777.225 e Porto Velho- 529.544, portanto a capital tem 29,8% do total do Estado. Esta estimativa tem falhas, porque as mesmas condições para o Brasil e o Estado de Rondônia não podem ser linearmente aplicadas e por isso podem estar superdimensionadas, entretanto os valores valem como alerta para as autoridades organizarem a execução e fazerem planejamento da gestão da crise.
No quadro 01 estão apresentadas as estimativas para infectados, mortes, demanda de UTI para os 5 cenários. As quantidades perpassam do pior cenário com 90% da população infectada e 2.910 mortos, e no melhor cenário são infectados 5% da população e 112 mortes. Nenhum dos dois cenários se aplicam a cidade, mesmo assim os valores são assustadores, porque há falta de UTI para os cenários possíveis, falta de teste para identificação de infectados e a baixa mobilização dos poderes Municipal e Estadual para implantar procedimentos visando reorganizar o sistema de saúde para otimizar o atendimento ou mesmo de fazer ações preventivas.
O que vai acontecer na cidade de Porto Velho em termos de danos a população e aos impactos na cidade não tem relação unicamente aos procedimentos médico, porque não há vacinas e, tampouco, medicamentos apropriados para o tratamento, mas sim numa relação de causa e efeito aos procedimentos implantados pelos Poderes Públicos. No quadro 02 estão expostas questões e como elas podem impactar na situação futura e as consequências da pandemia de covid-19 na cidade de Porto Velho.
Quadro 01: Cenários para infectados na cidade de Porto Velho
Porto Velho |
Cenário 1 |
Cenário 2 |
Cenário 3 |
Cenário 4 |
Cenário 5 |
População Infectada |
474.324 |
308.199 |
305.196 |
125.272 |
28.937 |
% da população |
90 |
58 |
58 |
24 |
5 |
mortes |
2.910 |
1.584 |
1.338 |
521 |
112 |
% da população |
0,55 |
0,30 |
0,25 |
0,10 |
0,02 |
necessitando internação |
15.676 |
8.831 |
8.138 |
2.987 |
632 |
Demanda pico epidemia** |
17.887 |
10.077 |
9.286 |
3902 |
614 |
necessitando UTI |
3.858 |
2.100 |
1.774 |
245 |
145 |
demanda UTI pico epidemia* |
1.037 |
564 |
477 |
66 |
39 |
demanda maior UTI utilizados no pico |
6 |
3 |
3 |
1 |
1 |
* para os cenário de 1 a 4 foram definidos pelo mesmo percentual do cenário 5
** uso da média das relações demandadas na epidemia por internação
Quadro 02: Questões definidoras do cenário para Porto Velho
Ação do poder Público |
Impacto na contaminação pelo coronavírus |
Apoio do poder público para o isolamento social da população |
O principal vetor de contaminação é o contato social, quanto maior o apoio e ação do Poder Público menor é o crescimento da contaminação e das mortes. Essa questão tem relação direta, porque diminuir o número de contaminados pode evitar o colapso do sistema de saúde. |
Ação do Poder Público de monitoramento |
A testagem e disponibilização dos resultados é essencial para que haja clareza de como fazer o monitotamento e o isolamento dos infectados, bem como acompanhamento daqueles que tiverm contato com o contaminado visando cessar a rede de contaminação, para diminuir a curva de crescimento e o colapso do sistema de saúde. |
disponibilidade de leitos de UTI |
Uma parte dos contaminados precisarão de tratamento de UTI, portanto a quantidade e a organização dos leitos é necessário para diminuir as mortes |
organização do sistema de saúde |
Um sistema de saúde organizado e coordenado é capaz de dar respostas rápidas para a pandemia. |
população rural e ribeirinha afastada da cidade |
Uma quantidade grande de pessoas vivem nas áreas ribeirinhas e longe de Porto Velho, sem intervenção haverá contaminações e mortes porque o sistema de saúde e as condições nestes locais é precário. |
parte da população no grupo de risco |
Aqueles que fazem parte do grupo de risco devem ser monitorados e devem estar em isolamento. |
vulnerabilidade da população |
A vulnerabilidade das habitações com adensamento excessivo é um problema por falta de condições de isolamento |
Fonte: Elaboração própria, 2020.
A seguir serão discutidas as ações que estão sendo desenvolvidas pelo poder público na cidade de Porto Velho, relacionado às consequências negativas que podem ocorrer na cidade se não forem tomadas decisões e alteradas as prioridades de intervenção na sociedade portovelhense.
O apoio do Poder Público para o isolamento social da população. Há em alguma medida o apoio do poder público municpal ao isolamento social, entretanto não há ações organizadas e planejadas visando a conscientização da população para a necessidade deste procedimento.
Ação do Poder Público de monitoramento. O poder público não tem nenhuma ação de monitoramento, mesmo que a Prefeitura tenha informações daqueles casos de doenças que colocam o portador no grupo de risco. Da mesma forma, não há nenhuma ação para o avanço da testagem para detecção da contaminação.
Organização do sistema de saúde. A prefeitura não está desenvolvendo ações coordenadas para cooperar com o sistema de saúde visando atender a grande demanda no momento que os casos de doentes que necessitam de atendimento médico e/ou de UTI. De acordo com o IBGE3, a cidade de Porto Velho tem disponível 1023 leitos, sendo 598 públicos e 425 privados (Quadro 03). No sistema municipal há 140 leitos e 10 leitos de UTI, que coordenadamente deveria estar de prontidão para ser inserida dentro do sistema de saúde emergencial para o atendimento da coronavírus.
Disponibilidade de leitos de UTI. Estão disponíveis, segundo dados do DATASUS, 167 leitos de UTI na cidade de Porto Velho, 118 públicos e 49 privados (quadro 03). Há valores dispares para as quantidades de leitos de acordo com a fonte pesquisada, entretanto neste texto optou-se por utilizar os dados na base oficial de dados DATASUS4. Esta quantidade de leitos de UTI será insuficiente para o período quanda a demanda crescer e ainda vale destacar que nem todos estes tem ventilação pulmonar que é o equipamento necessários para o uso no tratamento do convi-19. Na previsão feita, a quantidade de infectados demandará 3 vezes mais leitos de UTI do que a quantidade disponível, portanto é provável que haja colapso do sistema de saúde no ponto mais grave da pandemia.
Parte da população no grupo de risco. A covid-19 ataca predominantemente o sistema respiratório, dessa forma, é necessário cuidar sobremaneira daqueles tem este tipo de doenças pré-existente no sistema respiratório, entretanto os registros médicos indicam que as consequências do covid-19 são graves também para aqueles que tem doenças crônicas. O quadro 04 apresenta valores de morbidade para doenças respiratórias, neoplasias e aparelho circulatório, o município deveria monitorar e ajudar no isolamento das pessoas que tem estas doenças e outras, tais como diabetes e hipertensos.
Quadro 03: Número de leitos e disponibilidade de UTI em Porto Velho
Unidades de saúde |
Leitos |
UTI |
isolamento |
Hospital e Pronto Socorro João Paulo II |
187 |
10 |
1 |
Assistência Médica Intensiva - AMI |
35 |
31 |
4 |
Centro de Medicina Tropical de Rondônia CEMETRON |
100 |
7 |
24 |
Hospital de Base Dr. Ary Pinheiro |
552 |
10* e 3** UTI cardíacas |
|
Hospital Infantil Cosme e Damião |
140 |
10 |
|
Hospital Central de PVH*** |
|
9 |
|
Hospital do Amor |
|
20 |
|
Hospital SAMAR*** |
|
41 |
|
Descrição UTI adulto |
existente |
SUS |
Não SUS |
26 |
0 |
26 |
|
138 |
118 |
20 |
|
3 |
0 |
3 |
|
UTI adulto |
167 |
118 |
49 |
78 |
0 |
3 |
|
total UTI adulto mais neonatal |
245 |
45 |
82 |
Fonte: CNES5; Dezembro de 2019; *Fonte de Profissionais da Saúde de Porto Velho;*** hospitais privados.
Quadro 04: Morbidade de doenças em PVH
Doenças- Ano de 2017 |
Casos |
Taxa por 100 mil habitantes |
Tuberculose |
330 |
66 |
doenças do aparelho respiratório |
253 |
49 |
Neoplasias |
322 |
62 |
Aparelho circulatório |
376 |
72 |
Fonte: SIM/DVS/SEMUSA/PV6, 2018
População rural e ribeirinha afastada da cidade e vulnerabilidade da população. Há uma população significativa que vive nas áreas afastadas da cidade de Porto Velho, na região do baixo madeira e os demais distritos, que tem atendimento de saúde e transporte para cidade precários, estão vulneráveis quanto a pandemia, dessa forma a prefeitura deveria realizar ações visando isolar as possibilidades de contaminação nestes locais.
A vulnerabilidade ou inadequação de infraestrutura das habitações em PVH (quadro 05) chegam a 71% dos domicílios, agravando o quadro tem 5.506 residências em habitações com adensamento excessivo e podendo chegar a próximo de 27,5 mil pessoas (se utilizar 5,3% da população estadual em PVH chega 28 mil pessoas). Estas deficiências agravam o quadro de contaminação, porque há falta de água, de esgotamento sanitário, de coleta de lixo e de banheiro. Estas habitações, com frequência, estão localizadas em áreas vulneráveis onde a situação econômica impede que haja produtos em quantidade adequada para a higienização. Por outro lado, nestes domicílios podem ter pessoas no grupo de risco que deveriam ser isolados, visando diminuir a possibilidade de contaminação e de mortes.
Quadro 05: Carências de infraestrutura das habitações na cidade de Porto Velho
|
|
|
|
|
|
Abstecimento de água |
Esgotamento sanitário |
Iluminação elétrica |
Coleta de lixo |
Ausência de banheiro |
Adensamento excessivo |
58.576 |
52.452 |
424 |
3.648 |
4.764 |
5.506 |
Fonte: Déficit habitacional municipal no Brasil 20107.
De acordo com o exposto, no que tange a ação dos Poderes Públicos Municipal e Estadual, das peculiaridades vinculadas com a vulnerabilidade da população, a falta de leitos de UTI, a falta de testes para detecção de contaminação e a desorganização do sistema de saúde, o cenário que a cidade pode experimentar transita entre o 2 e 3, com mais de 305 mil infectados que é 58% da população e entre 1,6 mil e 1,4 mil mortes, com demanda de 500 leitos (447 para o cenário 3 e 564 para o cenário 2) de UTI. Portanto, é um quadro desolador para a cidade e que deveria ser objeto de preocupação da sociedade e dos Poderes Públicos.
1 https://www.imperial.ac.uk/media/imperial-college/medicine/sph/ide/gida-fellowships/Imperial-College-COVID19-Global-Impact-26-03-2020.pdf
2 Artur de Souza Moret. “Uma visão prévia sobre o crescimento da contaminação do covid-19: as condições implantadas e os cenários para o Estado de Rondônia”. http://www.coronavirus.unir.br/noticia/exibir/10944
6 PMPV. Relatório Anual de Gestão- Ano: 2017. Secretaria Municipal de Saúde. Porto Velho, 2018. Acesso em: https://semusa.portovelho.ro.gov.br/uploads/arquivos/2018/10/23266/1539704917relatorio-anual-de-gestao-2017-atualizado.pdf
Fonte: GPERS